sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Capítulo 8 - A porta

        Luca não conseguiu dormir pensando em tudo o que deveria fazer no dia seguinte. Ele sabia que a fusão entre a água e o fogo não era algo simples. Somar esses dois elementos sem que se anulassem requeria domínio de energia e magia, e essa segunda habilidade ele não possuia. As palavras de Ayla o ensinando sempre ecoavam em sua mente "Primeiro a sensibilidade energética, que você já possui, depois a habilidade de transferir energia de um objeto para outro, o que você não consegue dominar por completa falta de concentração..." Ele conseguia perceber muito bem a energia a sua volta, mas "mexer" com a energia, como Ayla fazia ao acalmar um corpo febril ou estimular o crescimento das flores, era outra história. Agora era o momento de reunir toda a concentração que pudesse para abrir a passagem, mas ainda faltava o componente mágico e ele sabia exatamente quem poderia ajudá-lo.
        As duas únicas pessoas que sabiam sobre a passagem eram Ayla e Fred, que também não dominavam magia, mas havia uma pessoa, extremamente confiável, que poderia ajudá-lo. Apesar de ser um pouco difícil para Luca pedir favores para Sarah, ele sabia que era a única saída.
        Ainda estava escuro quando Luca chegou até a janela do quarto de Sarah e assobiou imitando um pássaro. Foi preciso repetir o som três vezes até que a jovem abrisse a janela e o olhasse com sono e surpresa.
        - O que houve, Luca? Ainda está escuro!
        - Eu sei, eu sei, mas preciso da sua ajuda e se possível antes que o Sol se levante.
        A menina fez um sinal indicando que iria encontrá-lo e fechou a janela. Luca sabia que não era certo pedir favores para Sarah sabendo que ela jamais negaria, mas sua necessidade de respostas era maior. A filha mais velha dos Trinid logo apareceu e eles caminharam até a entrada do bosque onde não seriam importunados. Luca precisava explicar para Sarah seu plano e convencê-la a participar.
        - Luca, você endoidou. Eu entendo a sua ânsia por entender o que se passou, mas olhe a sua volta. Você é feliz aqui, o Fred é como um pai, todos te adoram e eu...você sabe que pode contar comigo, mesmo não sendo da forma como eu gostaria.
        Ele sabia que esse assunto viria a tona, mas antes que ele tivesse que explicar novamente para Sarah que, apesar das tentativas de ficarem juntos, ele só a via como amiga, ela falou:
        - E você não precisa explicar nada de novo. Mesmo que você fosse mudo, você sabe que toda mulher sabe quando existe ou não o sentimento.
        Luca sempre esquecia que em Greenfar a intuição feminina era algo tão presente que era quase possível tocá-la.
        - Eu entendo tudo isso, Sarah. Fred também tentou me convencer do contrário, mas ele percebeu que é algo que eu preciso tentar com ou sem a ajuda de vocês. Você topa?
        - Topar o que? Você já falou de passagem, livreto, lendas, mas não disse em que precisa da minha ajuda.
        - Preciso da sua magia. Preciso que você me ajude a fundir água e fogo sem que eles se anulem.
        Sarah o olhou com espanto.
        - Luca, a cada instante eu acho que você enlouquece mais. Isso pode gerar desequilibrio, fora que nem deve ser permitido a não-magos. E seria preciso também controle de energia.
        - Dessa parte eu me encarrego. Por favor, me ajude! Só vamos tentar, pode ser?
        - Olha, eu vou acreditar que o Fred e a Ayla estão sabendo, está bem?
        Os dois pegaram uma grande vasilha de barro e foram até a beira do riacho, onde acenderam uma fogueira. Luca acreditava que com a ajuda de Sarah, a fusão seria simples, mas ele se enganou.
        - Luca, se você não estabilizar a energia dos dois elementos será impossível! De que adianta eu unir a água e o fogo, se você não consegue manter a energia deles em equilibrio?
        O dia já havia nascido e Sarah já estava entediada de erguer o fogo com uma mão, erguer a água com a outra, uní-los sobre a vasilha e nada funcionar. Luca tentava se concentrar de todas as formas possíveis, mas nada adiantava. Em alguns momentos parecia que funcionaria, mas logo só restava fumaça.
        - Você não acha que é um sinal para desistir, Luca? Não somos Magos para fazer isso.
        Luca então se sentou perto de um tronco e quando Sarah pensou que finalmente ele desistiria dessa loucura, percebeu a dor que esse fracasso trazia para ele. Talvez não estivesse funcionando não por ele, mas pela descrença dela. A jovem sentou-se ao seu lado, trouxe a vasilha para a frente dos dois e ergueu um pouco de água na altura dos olhos.
        - Vamos com calma, está bem? Tente estabilizar somente a água.
        Luca olhou para a esfera de água na sua frente, mas para ele o fracasso era tão concreto que só restava a serenidade do conformismo. Até que a esfera parou de se mover e ficou completamente estática flutuando. Com um movimento muito sutil, Sarah ergueu uma chama de fogo ao lado da esfera de água. A crepitação quase tirou a concentração de Luca e ele hesitou em estabilizar o fogo, com receio que o avanço com a água se perdesse. Após alguns instantes, o jovem fechou os olhos e não mais ouviu o crepitar do fogo. Se esse era um sinal de que ele havia estabilizado o fogo e a água, Sarah agora deveria unir os dois elementos em um só. Então ela sussurou:
        - Luca...olhe.
        Ao abrir os olhos, o rapaz ficou imóvel quase sem respirar observando o espelho líquido que havia se formado dentro da vasilha. Era exatamente igual a "tela"que ele havia visto na rua, no dia em que chegou a Greenfar, só que sem brilho, opaca. Aquela era a porta da passagem, agora ele precisava da chave.      

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